sexta-feira, janeiro 14, 2011

POSE ANIMAL




Retrato de cabra e cachorro
Extrema, MG. 2011
Fotografias: Ines Correa



Se em outros tempos a fotografia era cara e fazia parte do álbum de recordações de poucos, hoje até os animais parece que já sabem como sair bem na foto. Posam pra retrato, não querem sair de costas. Tipo, "sou da roça mas sei o que é isso aí na sua mão, viu?". Não precisa esperar nem mandar fazer. Eles pensam no fundo, olham entre os vãos da cerca diretamente para onde estamos. Preparam o corpo e esperam. É só aproveitar e clicar.

Fica a pergunta: quem viu primeiro, eles a mim ou eu a eles? E como me viram. Me ouviram ou sentiram? O cheiro chamou mais atenção? Meu movimento? O barulho do meu corpo ralando no mato?

Comecei a ler hoje um artigo do Ferreira Gullar, Barroco, olhar e vertigem, do livro O Olhar, organizado por Adauto Novaes. Não acabei de ler. Na primeira página Ferreira Gullar escreve:

"Se eu não olhasse, se eu não tivesse do mundo a apreensão pelo olhar, só o aprendesse pelo tato, pelos ouvidos, pelo olfato, pelo gosto, se eu só aprendesse assim, que noção eu teria por exemplo da manhã? O que seria a manhã, o amanhecer, o dia, e, o entardecer, a noite? Que visão teria eu dessa realidade, se eu não aprendesse o mundo pelo olhar? A textura, a corporeidade das coisas, dos objetos, é diferente se eu apenas os tocar com os dedos.".

Quando li esse primeiro trecho que deve ir para outro caminho que não esse que fui, pensei no cachorro e na cabra que me olharam na paisagem rural. Que olhar o deles? O que estavam vendo provavelmente era diferente do que via eu, não por ser eu o objeto do olhar deles e não eles mesmos, mas pelo fato da percepção ser mas rica no olfato e na audição... Enquanto em mim a imagem deles chegava primeiro pela visão da luz no corpo deles, nos pelos, na distância além da cerca.

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